* Do tempo realizado e do tempo sonhado *

30 de ago. de 2013

O sobrenatural

Na minha adolescência, de vez em quando eu passava o domingo na casa de meus primos.   
À noite, gostávamos de ficar na varanda, conversando ou jogando cartas.  Eles moravam em um bairro residencial, em uma rua tranqüila.
Foi um verão no Rio em que quase todo dia tinham os  apagões.

Certa noite, estávamos os três sentados na varanda, jogando conversa fora quando surgiu uma conversa sobre fatos estranhos que acontecem, coincidências da vida,  e naquele momento   houve um  apagão e a rua ficou às escuras. 
Aí, naquele clima, tive  uma idéia:
Gente, vou contar até dez e quando chegar no dez a luz da  rua  acenderá. Descrédito, risadas ( Pense nas probabilidades ).   
Fomos até o portão e eu comecei a contagem: 1...2...3...6...8...9...e...Apontei o dedo para o céu e... 10!  
Nisso, a rua inteira acendeu e ficamos os três mudos, de boca aberta e olhos arregalados para o novo céu. 

Corri pra dentro da casa para contar o ¨milagre¨;  nem pais nem tios acreditaram. 
Não liguei porque nós três testemunhamos, naquela noite, o sobrenatural.

26 de ago. de 2013

Os sentimentos dos patos


Moro no segundo andar do meu prédio.  Minhas janelas dão para um terreno comprido e com varias árvores frutíferas, incluindo um frondoso abacateiro que quase esbarra na janela da minha cozinha. Era quase uma chácara, com direito a galinhas comuns, galinhas d’Angola, um galo lindo que batizei de Sergei ( em homenagem ao cantor ) porque  ambos tinham a boca, o ¨bico¨ parecido.
Sergei era um fofo sem noção: cantava a qualquer hora do dia , da noite ou da madrugada, criando, inclusive um certo desespero em uma moradora igualmente sem noção.
Era uma delícia ver o espanto das pessoas que me visitavam ao ouvir os sons rurais que entravam em meu apartamento vindo de lá.  
Mas porque estou falando disso?
Porque como nada é perfeito, eles tinham também um casal de cachorros Fox paulistinhas . A fêmea era um doce mas o macho era bem raivosinho e volta e meia fugia da área em que moravam e era um Deus nos acuda para patos e galinhas.  

Foi aí que um domingo à tarde, vi o pai dos moradores, sentado em um tronco, incentivando sadicamente o cão a atacar um pato meio perdido no terreno . Assisti da minha janela o desespero total do patinho correndo pra lá e pra cá, perseguido pelo cachorro.  Comecei a gritar e xingar o velho de todos os nomes para que parasse com aquilo.
Qual não foi meu espanto quando o pato, descobrindo em mim uma aliada e cúmplice, veio correndo embaixo da minha janela quase escalando o muro que nos separava me olhando em total desespero.
O velho acabou entrando em casa levando o cachorro junto. O pato ficou ainda um tempo quietinho perto do muro, e naquele dia tudo acabou bem. 
Associamos a inteligência, a troca de afeto e sentimentos de gratidão aos cães, gatos, cavalos, macacos e etc...   Na minha ignorância, nunca imaginei que um pato tivesse sentimentos. Fiquei surpresa com aquele pobre patinho me pedindo socorro, do entendimento dele de que eu fiz tudo que pude para salvá-lo e que consegui.

Vivi e senti.  Desde aquele dia passei a entender e acreditar que todos os animais têm sentimentos; é só uma questão de darmos uma chance a eles.